Será que podemos ter certezas hoje em dia?

Será que podemos ter certezas hoje em dia?


Se pensares um pouco, qual é a única certeza que tens nesta vida? Será que temos alguma certeza nesta vida?  

Há uns anos vi um vídeo que me ajuda muito a pensar sobre certezas (e incertezas). Chama-se the wear sun screen song ou em português “a canção para usar protetor solar”.  

Era um daqueles vídeos que de forma aleatória aparecem na nossa lista de reprodução do YouTube. As imagens são com certeza anteriores à era digital. Digo isto porque as imagens se pareciam muito com os vídeos caseiros feitos pelo meu pai, quando eramos pequenas, naquelas câmaras de filmar que tinham de se pôr em cima do ombro. (O meu pai foi o primeiro dos amigos a ter uma câmara de filmar. Foi-lhe oferecida pelo meu tio-avô que desde novo fazia filmes e quando imigrou para a Austrália abriu um cinema até ter feito parte da equipa que construiu a saga do Matrix. Mas esta é outra história).  

Não percebi porque é que o algoritmo deste canal achou que eu devia ver este vídeo, mas começa com uma voz que narra, “Senhoras e senhores da turma de 99 usem protetor solar… se eu puder dar-vos um conselho em relação ao futuro, diria: usem protetor solar”. A nossa curiosidade aumenta enquanto esta voz que se parece com a voz do Morgan Freeman quando interpreta Deus, mas que é na realidade a voz do Baz Luhrmann, produtor de filmes australiano, talvez amigo do meu tio-avô, continua a dar conselhos que ele próprio diz, não são tão importantes quanto, usar protetor solar ao mesmo tempo que pensamos se será apenas mais um daqueles vídeos inspiracionais com dois ou três clichés. De 1997 para hoje, eis algumas das frases do vídeo: 

“(…)Desfruta do poder da beleza de tua juventude.  

Esquece, só vais compreender o poder e a beleza da tua juventude quando já tiverem desaparecido. Mas acredita em mim, dentro de vinte anos, vais olhar para as tuas fotos e vais perceber de uma forma que hoje não podes compreender, quantas oportunidades se 
abriram para veres que eras realmente fabuloso/a. Não és tão gordo/a quanto imaginas. 

Não te preocupes com o futuro, ou preocupa-te, se quiseres, sabendo que a preocupação é tão eficaz quanto tentar resolver uma equação de álgebra mastigando pastilha elástica. É quase certo que os problemas que realmente têm importância são aqueles que nunca te passam pela cabeça, como aqueles que tomam conta de ti às 4 da tarde num momento em que não estás a fazer nada. 

Faz todos os dias, alguma coisa que te assuste. 

Canta! Não trates os sentimentos alheios de forma irresponsável. Não toleres aqueles que agem de forma irresponsável em relação aos teus.  

Relaxa! Não percas tempo com a inveja. Algumas vezes és tu que ganhas, algumas vezes és tu que perdes. 
A corrida é longa, mas não é um sprint é uma maratona no final, contas só contigo. 
Lembra-te dos elogios que recebes. Esquece os insultos. (Se conseguires fazer isto, diz-me como). 
Guarda as tuas cartas de amor. Joga fora as notas dos teus testes.  

Estica-te! 
Não tenhas sentimentos de culpa se não sabes muito bem o que queres fazer da vida. As pessoas mais interessantes que conheço não tinham aos 22 anos, nenhuma ideia do que fariam da vida. Algumas das pessoas mais interessantes de 40 anos que conheço ainda não sabem. 
Toma bastante cálcio, sê gentil com os teus joelhos. Sentirá falta deles quando deixarem de funcionar. 
Talvez venhas a casar, talvez não. 
Talvez tenhas filhos, talvez não. 
Talvez te divorcies aos 40, talvez dances a Macarena no teu casamento com 75 anos de idade. 
O que quer que faças, não sejas demasiado orgulhoso/a nem critiques demais. 
Todas as tuas escolhas têm a probabilidade de 50% correr bem, como as de toda a gente. 
Aproveita o teu corpo da melhor maneira que puderes, não tenhas medo dele ou do que as outras pessoas pensem dele. 
Ele é o teu maior instrumento. 
Dança! Mesmo que o único lugar que tenhas para dançar seja a tua sala de estar.  

Lê todas as indicações, conhece todas as regras mesmo que não as cumpras.  

Não leias revista cor-de-rosa, a única coisa que elas tentam fazer é mostrar como és uma pessoa feia. 
Tenta entender os teus pais, não sabes a falta que podes vir a sentir deles. Sê agradável com teus irmãos/ãs, eles/as podem tornar-se o teu maior vínculo com o passado e aqueles que, no futuro, podem vir a cuidar de ti. 

Aprende que os amigos vão e vêm, mas que há uns quantos, que podes guardar com carinho e tenta sempre transpor os obstáculos geográficos que vida impõe, porque, quanto mais envelheces tanto mais precisas das pessoas que te conheceram na juventude. 
Viaja! Aceita que certas verdades são eternas: 
Os preços vão sempre subir; os políticos são todos corruptos e mulherengos;  

TU! Também vais envelhecer e quando envelheceres, vais pensar que, quando eras jovem, os preços eram mais baixos, os políticos eram mais honestos e as crianças respeitavam os mais velhos. 
Respeita as pessoas mais velhas! 

Não esperes apoio de ninguém. 

Talvez tenhas uma reforma. 
Talvez te cases com uma pessoa rica. 
Mas, nunca saberás quando uma ou outra podem desaparecer. 
Não faças muitas loucuras com o teu cabelo. senão, quando tiveres 40 anos vais parecer ter 85. 
Tem cuidado com as pessoas que te dão conselhos, mas sê paciente com elas.  

Os conselhos são uma forma de nostalgia. Dar conselhos é uma forma de resgatar o passado 
do caixote do lixo, limpá-lo, esconder as partes feias, reciclá-lo e vendê-lo por um preço maior do que realmente vale. 
Mas, acredita em mim quando eu digo, usa protetor solar.” 

Para ver: https://www.youtube.com/watch?v=MeZQfJaEcgQ 

Não sei quanto a vocês, mas a mim ajuda-me pensar que há verdades certas nas nossas vidas, que eram as mesmas quando os nossos pais eram jovens e que continuarão a ser quando já cá não estivermos. 

Contornar a ansiedade e continuar a viver quando o mundo á nossa volta parece estar a desmoronar-se e tudo o que conhecemos parece estar a desaparecer, lembrarmo-nos que ainda estamos aqui, que sobrevivemos a uma pandemia, ultrapassámos dificuldades, adaptámo-nos às exigências destes tempos e ainda conseguimos de forma crítica perceber que a situação dos refugiados é uma crise de racismo de toda a Europa. A forma como nos organizámos para receber pessoas da Ucrânia poderia ter sido também feita para refugiados de outras nacionalidades do Médio Oriente e de África. Sabermos que as certezas que existem são as mesmas para todas as pessoas, sabermos que “muito mais é o que nos une que aquilo que nos separa” (já dizia o Rui Veloso), e sabemos que a linha entre nós e ou outros é muito mais fina que a que nos querem fazer acreditar e que, toda a gente merece dignidade e uma vida plena. Que toda a gente merece decidir sobre as suas vidas e ser recebida de braços abertos em qualquer território.  

Toda a gente deve usar protetor solar.  

Por isso continuar a apoiar refugiados é tão importante e diz-nos tantos sobre as certezas que temos da vida, do mundo e de nós próprios/as.

Alexa Santos
Técnica da Juventude da área da Cidadania e Direitos Humanos